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Câncer de tireoide: quando é indicada a cirurgia e quando pode ser feita a ablação por radiofrequência?

Recentemente, uma nova técnica para tratamento de nódulos benignos que causam sintomas e para câncer de tireoide diagnosticados em estágios iniciais, chamada ablação po radiofrequência (ou radioablação) vem ganhando espaço como uma opção à cirurgia.


mulher com mão no pescoço

Localizada na parte anterior do pescoço, a tireoide é uma glândula formada por dois lobos. Pequena, mas com funções muito importantes, a tireoide é responsável pela produção de hormônios que regulam o funcionamento e desenvolvimento de todo o organismo.


Entre os problemas de saúde que podem afetar a tireoide está o desenvolvimento de nódulos, que podem ser benignos ou malignos (câncer de tireoide). O aparecimento de nódulos na tireoide pode ocorrer em homens e mulheres, mas é muito mais comum na população feminina, principalmente, após os 50 anos de idade.


A imensa maioria dos nódulos de tireoide são benignos e, no caso, de serem assintomáticos, não é necessário tratamento específico, apenas acompanhamento ultrassonográfico e endocrinológico. Já os nódulos benignos que causam sintomas, seja pelo grande volume ou, eventualmente, por causarem hipertireoidismo (nódulos tóxicos), devem ser tratados.


Tumores malignos na tireoide correspondem a aproximadamente 5% dos casos em que há nódulos palpáveis. O câncer de tireoide apresenta, na maior parte dos casos, comportamento indolente (crescimento lento) e bom prognóstico. Essa característica permite que casos muito bem selecionados de tumores iniciais sejam acompanhados de perto, com seguimento ultrassonográfico e sem tratamento cirúrgico, dentro de um protocolo de vigilância ativa, o que já é bem estabelecido na literatura


A maior parte dos tumores malignos, entretanto, não preenche os critérios para esse tipo de abordagem e demandará tratamento cirúrgico. Casos de câncer de tireoide mais agressivos, embora correspondam à minoria dos tumores malignos, existem e devem ser identificados, a partir de suas características, no exame de ultrassonografia.


Recomenda-se que a ultrassonografia, com fins diagnósticos, seja realizada nos pacientes com: disfunção hormonal da glândula; detecção de nódulo na tireoide ao exame clínico de palpação; história familiar de câncer de tireoide; história pregressa de exposição à radiação ionizante na região do pescoço. A ultrassonografia (US), quando realizada por radiologista experiente no método, é um exame efetivo na detecção de nódulos suspeitos de malignidade e define a eventual indicação de biópsia, que é realizada por meio do método de punção aspirativa com agulha fina (PAAF) guiada por US.


Para o tratamento de nódulos comprovadamente benignos da tireoide, existem técnicas minimamente invasivas que permitem a resolução dos sintomas sem a necessidade de remoção da glândula. Pode ser realizada a ablação química (com etanol) ou ablação térmica (com radiofrequência, microondas ou laser).


No caso de nódulos benignos císticos, em que a nodulação é preenchida por líquido, a técnica de ablação por etanol pode ser eficiente e tem menor complexidade, quando comparada com a ablação térmica. Nesses casos o tratamento, guiado por ultrassonografia, é feito a partir da aspiração do conteúdo do cisto seguida da injeção de pequena quantidade de etanol no seu interior, o que gera destruição das células da parede interna do cisto, evitando que a coleção líquida se forme novamente.


No caso de nódulos benignos sólidos que causam sintomas, pode ser realizado tratamento com ablação térmica. No nosso meio, a técnica mais empregada é a ablação por radiofrequência, ou radioablação. Nesse tratamento, ocorre a destruição térmica do tecido que forma o nódulo, a partir da introdução de uma agulha com eletrodo no interior da tumoração, guiada por ultrassonografia. A destruição tecidual é promovida pela liberação controlada de energia na forma de radiofrequência. Após a ablação por radiofrequênica, o nódulo sofre absorção lenta e gradual nos meses subsequentes ao tratamento, chegando a reduzir de 80% a 90% do volume.


A ablação por radiofrequência é um tratamento eficiente para redução de volume de nódulos benignos que causam desconforto estético ou funcional, e também para controle de função dos nódulos benignos tóxicos, que causam hipertireoidismo. Com essa modalidade de tratamento, não há a necessidade de remoção da tireoide, com as vantagens de não existir cicatriz no pescoço, menores taxas de complicações e de não ocasionar a necessidade de reposição de hormônio tireoidiano.


Nos casos de câncer de tireoide, por sua vez, a ablação por radiofrequência pode ser considerada como uma opção de tratamento para casos muito bem selecionados de tumores iniciais. Pode haver indicação da técnica em nódulos menores que 1 cm, sem contato com a cápsula glandular, condições que permitem a completa destruição do tecido tumoral e de ampla margem de segurança em tecido tireoidiano normal adjacente.


Nos casos de câncer de tireoide de maior volume, ou nos casos em que há contato com a cápsula glandular, ou mesmo nos casos de doença multifocal, o tratamento cirúrgico permanece sendo a única alternativa de abordagem efetiva.


A ablação por radiofrequência traz muitas vantagens quando comparada à cirurgia: técnica minimamente invasiva, realizada sob sedação, com alta hospitalar no mesmo dia, sem cicatriz no pescoço e com preservação da glândula tireoide funcionante, com menores taxas de complicações relacionadas à qualidade vocal e função das paratireoides. Todavia, ainda não é um procedimento com indicação ampla para todos os casos de tumores tireoidianos. A seleção do paciente ideal para essa modalidade terapêutica deve passar pela avaliação prévia de endocrinologista, radiologista e cirurgião de cabeça e pescoço com grande experiência no tratamento de neoplasias tireoidianas.


A técnica já está consolidada como uma das opções de tratamento para nódulos benignos volumosos e/ou hiperfuncionantes. Entretanto, para o tratamento de neoplasias malignas iniciais, embora os resultados de estudos de seguimento demonstrem não-inferioridade em relação ao tratamento convencional, e com menores taxas de complicações, por se tratar de técnica recente ainda não há estudos com mais de dez anos de seguimento, o que limita as indicações aos casos nos quais seria admissível a abordagem com vigilância ativa, mas nos quais o paciente não apresenta o perfil adequado para essa modalidade.


É esperado que novos estudos, com maior tempo de seguimento, tragam resultados que permitam a consolidação da indicação da ablação por radiofrequência como uma das modalidades de tratamento para os pacientes com câncer de tireoide nos estágios iniciais.



Gustavo Meyer, cirurgião de cabeça e pescoço, professor do departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.

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